Ao olhar para o teatro de 2025, vejo com clareza que o ano se organizou em torno de dois grandes eixos — caminhos possíveis para a arte da representação.
De um lado, a comédia ocupou um espaço central. Autores brasileiros como Miguel Falabella e Jô Bilac encheram plateias com um teatro de narrativa direta, comunicação clara e profunda ligação com a tradição da cultura carioca. É um teatro construído a partir da gargalhada aberta, do deboche inteligente, sem quiproquós excessivos, criando um clima de alegria que reafirma o palco como espaço de encontro. Um teatro que entende o riso como linguagem cultural e social. Férias, O Formigueiro, Fica Comigo Esta Noite e A Sabedoria dos Pais lotaram — e lotaram.


No outro eixo, destacou-se a presença insistente — por vezes excessiva — da metalinguagem. Peças organizadas como “teatro dentro do teatro”, atravessadas por conflitos de ensaio e pela angústia do ato de criar. Ainda assim, há um ponto de convergência importante: essas obras reafirmam a experiência presencial como valor inegociável. Falar de si mesmo, aqui, foi também uma forma de lembrar que o teatro só existe plenamente no encontro entre corpos vivos.
Essa defesa do teatro como experiência encontrou sua expressão mais contundente no que considero o fato do ano: a inauguração do Cabaré do Gláucio. Sob a idealização de Rafael Raposo e curadoria de Christina Streva e Ricardo Nolasco, assistimos à recuperação de uma manifestação artística historicamente apagada, agora devolvida ao público de forma transbordante. César Augusto, Orlando Caldeira e Gilberto Gawronski comandaram cabarés inesquecíveis, com filas dobrando o quarteirão. Destaque absoluto para o ator Well (a) Soares, artista completo, que dança, canta, interpreta, costura, chuleia.

Nesse mesmo campo de reflexão sobre identidade, deslocamento e presença, dois trabalhos de dramaturgia francesa marcaram o ano. Migrantes, de Matéi Visniec, com adaptação e direção de Rodrigo França, reafirma o teatro como espaço de escuta e travessia humana. Já Eddy – Violência & Metamorfose, a partir da obra de Édouard Louis, impõe-se pela contundência: palavra, corpo e gesto em estado de choque, expondo a brutalidade do cotidiano sem filtros nem concessões.
Os grandes musicais também marcaram fortemente o ano. Traduções da Broadway e biografias de artistas brasileiros se afirmaram como a principal tônica do entretenimento para toda a família. Djavan – O Musical e Rita Lee foram destaques, confirmando a força desse formato junto ao grande público.

Mas foram dois espetáculos sobre eméritos sambistas cariocas que, para mim, tocaram num ponto ainda mais profundo. Zé Ketti, Eu Quero Matar a Saudade, de Leandro Santanna, e Pérola Negra do Samba, de Luís Antonio Pilar, nos devolvem um Rio que muitos tentam apagar: o subúrbio, a vizinhança, o feirante, as rodas de samba. Em Pérola Negra, os figurinos de Rute Alves ampliam essa potência, fazendo-nos ver como o Rio foi — e como continua sendo — um celeiro fundamental da música brasileira.
Ao final de 2025, o que permanece é a certeza de um teatro múltiplo e vivo. Do riso à reflexão, do cabaré ao musical, a cena reafirma algo essencial: nada substitui a experiência do encontro presencial entre palco e plateia.


